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FOOD (Nova Iorque, 1971-1974)


Tina Girouard, Carol Goodden e Gordon Matta-Clark na entrada de Food.

Foto: Richard Landry, 1971


A cena artística de Nova York nos anos 70 O Maio de 68 na Europa e nos Estado Unidos ficou marcado por manifestações de estudantes, trabalhadores, ativistas, intelectuais e artistas, contra as instituições, a sociedade de consumo, o capitalismo e o imperialismo. Nos anos 70 em Nova Iorque foi evidente a influência das manifestações de 68 e, é neste contexto que, surge a Crítica Institucional, ou a Critica Artística às Instituições, que teve um impacto significativo naquilo que foi o crescimento dos espaços independentes. A critica institucional foi feita por artista com uma posição extremamente radical face às instituições e teve o intuito de denunciar e questionar as instituições e a institucionalização da arte e da cultura. Robert Smithson em 1972 escreveu para a Artforum um texto a que chamou de “Cultural Confinement” onde faz uma forte crítica às instituições de arte, comparando-as a prisões:

“Museums, like asylums and jails, have wards and cells – in other words, neutral rooms called ‘galleries.’ A work of art when placed in a gallery loses its charge, and becomes a portable object or surface disengaged from the outside world. A vacant white room with lights is still a submission to the neutral. Works of art seen in such spaces seem to be going through a kind of esthetic convalescence.”

Foi neste seguimento que surgiram os primeiros espaços independentes, da necessidade de os artistas pensarem noutras alternativas de exporem o seu trabalho. Da primeira geração de espaços independentes em Nova Iorque, fizeram parte a galeria 112 Greene Street (1970), FOOD (1971), a P.S.1 (1971) e a A.I.R Gallery (1972). Aqui, realça-se a 112 Greene Street, uma galeria pioneira em dar palco a uma jovem geração de artistas que procurava um substituto ao circuito de galerias estabelecido em Nova York. Foi fundada por Jeffrey Lew com um apoio especial de Gordon Matta-Clark e Alan Saret, foi um espaço de performance e exposição, um ponto de encontro que possibilitou extrema liberdade para a criação artística. Não era uma galeria comercial, recusava deixar-se definir, foi irreverente por permanecer 24 horas aberta e até a estética do edifício era uma antítese completa daquilo que era o “white cube” das galerias comerciais: um edifício em bruto, com marcas de sujidade e do precário. Suzanne Harris, Tina Girouard, Richard Landry, Trisha Brown, Vito Acconti, Richard Serra, Susan Rothenberg, e Gordon Matta-Clark foram alguns dos muitos artistas que expuseram na 112 Greene Street.4 Foi, portanto, uma galeria não-convencional que se foi construindo enquanto processo de experimentação, tendo um papel importantíssimo não só para os artistas- como descreve Suzanne Harris “We just wanted to get out work out and it was fantastic to have a place that wasn’t pristine, that we could knock around in.”-, mas também para impulsionar uma série de outras iniciativas coletivas que se seguiram. Outro contributo importante para a cena artística de Nova York foi a revista Avalanche, fundada em 1968 por Liza Béar e Willoughby Sharp, que documentou as exposições, performances e a vida pessoal dos artistas que viviam e trabalharam em torno da 112 Greene Street e Food. Foi uma fonte primária de informação que inclui inúmeras entrevistas e fotografias raras sobre os eventos que marcaram a arte contemporânea deste período. A cena artística em Nova York dos anos 70 ficou marcada pela rede comunitária autossustentável e cooperativa que os artistas estabeleceram para se sustentarem, documentarem e mostrarem o seu trabalho que incluía a revista Avalanche, a 112 Greene Street e Food. Os artistas tinham os seus próprios espaços de exposição e convívio (112 e Food) e a sua própria revista (Avalanche).




FOOD: Arte e Restaurante


On Saturday, September 25, to mark the unofficial opening of Food, an artist-run restaurant at 127 Prince Street, free garlic soup, gumbo, chicken stew, wine, beer, and homemade breads were served to friends, gallery-goers, and passers-by until late in the evening.


Food misturou arte e vida dentro das suas paredes e todos os que por lá passaram sentiram essa atmosfera. “Food was run by artists for artists”, deu emprego a artistas e possibilitou que estes se sustentassem, trabalhando como cozinheiros, servindo às mesas, ou realizando qualquer outra função que fosse de encontro às necessidades do restaurante. Deu resposta às necessidades dos artistas que, trabalharam para criar coesão com a sua comunidade e criaram uma infraestrutura para desenvolver isso, como disse Suzanne Harris “We didn’t need the rest of the world. Rather than attacking a system that was already there, we chose to build a world of our own.”. Carol Goodden, Gordon Matta-Clark e todos os outros envolvidos, tornaram-se artistas empreendedores que quiseram formar uma estrutura administrativa e autónoma para artistas-trabalhadores: uma estrutura autónoma de um mundo da arte institucionalizado. Carol Goodden sabia na altura que muitos artistas tinham problemas com os empregos que encontravam devido à falta de flexibilidade que existia, realçando que “Some even lost their jobs if they chose to leave for a week in order to mount and attend a show that they had been invited to, which was important, needless to say to their very survival as an artist.”. O artista Robert Kushner começou a trabalhar no Food quando se mudou para Nova York em 1972, e nas suas performances de início de carreira, a comida que utilizava era proveniente do seu local de trabalho. O seu emprego não só o ajudou a sustentar-se a si próprio como também ajudou a fornecer matéria prima para o seu trabalho enquanto artista. Goodden afirmou que:

“For three years, FOOD earned enough money to pay its bills, feed Gordon and me, some friends, our workers, and some bums who came in the back door. For three years FOOD employed, over that time, roughly sixty artists so that they could afford to live in New York while they struggled with their art career.”

Robert Kushner and Friends Eat Their Clothes (1973)

Quem percebe melhor este problema generalizado entre os artistas que tentam manter um emprego, senão os próprios artistas? Para quem quer desenvolver uma carreira artística é importantíssimo participar em certas exposições ou ir a certos eventos, para que a sua sobrevivência no mundo da arte seja reconhecida. É preciso estar em cima do acontecimento e, no bairro de Soho nos anos 70, não só se conseguiu dar empregos flexíveis aos artistas como ainda conseguiu desenvolver um epicentro artístico, criando eventos e locais para discutir e exibir arte. Food’s Family Fiscal Facts um documento - e objeto artístico -publicado em 1972 na revista Avalanche, foi uma criação de Tina Girouard, Goodden, Matta-Clark e da editora Liza Béar. No documento aparece uma longa lista com todos os investimentos feitos pelo restaurante- gastos da renda, telefone ou lavandaria-, o valor total dos salários, as receitas geradas e, ainda, estatísticas sobre o dia-a-da do restaurante. Nesta última é possível verificar que foram dados 3082 jantares gratuitos, que houve 41272 clientes, mas, estes números foram apresentados sempre com uma ideia sarcástica associada, aparecendo na lista também que 99 dedos foram cortados, que 15 garrafas de champanhe desapareceram, ou que 213 pessoas “needed to get it together keep it together”. Em baixo destas tabelas, aparece uma uma enorme quantidade de nomes associados ao projeto e sem que nenhum esteja mais destacado que os outros, realçando muito a ideia de comunidade e, da igual importância entre todos os envolvidos no projeto.


Gordon Matta-Clark organizou para as noites de domingo o “Guest Chef Day” em que artistas foram convidados para cozinharem refeições. Entre os muitos convidados estavam Donald Judd, Richard Landry, Italo Scanga, Joan Shapiro ou Robert Rauschenberg que numa noite serviu chili caseiro. Uns preferiram cozinhar comida mais simples, outros escolheram uma abordagem mais experimental, elaborando pratos que costumavam ser mais “comida para o pensamento” do que comida para, de facto, se comer. No famoso jantar “Matta-Bones” em 1972, Gordon serviu sopa de rabo de boi, ossos de tutano, ossos recheados, pernas de rã e ossos assados por apenas quatro dólares. No final do jantar os ossos foram limpos e perfurados para serem colocados em colares que os convidados puderam levar para casa. O cozinhar era claramente visto como um acto performativo, esta refeição estendeu-se para lá do próprio jantar, que quando deixou de ser comida, se tornou num objeto. Outra criação de Matta-Clark, foi o documentário Food (1972), um filme que documentou aquilo que era um dia inteiro na rotina do restaurante: começa com Carol Goodden a ir ao mercado de peixe pela manhã, mostra-nos o restaurante vazio, a preparação da comida, os clientes a comerem e, no final, acaba com um grupo de pessoas sentados à volta de uma mesa a conversar enquanto fazem a sua refeição, num ambiente ruidoso, cheio de vozes e, muita vida. Trabalhar em Food e conviver neste ambiente de experimentação e liberdade, deu muita matéria de criação para os artistas; Food fez aproximar, ainda mais, a arte e a vida.


Though we consumed food, Food consumed us. It was a free enterprise which gave food away much too freely. Food (me) was much more concerned with how it looked than how economically it ran and it (Gordon) was much more concerned about how charming, stimulating and friendly it was than how much customers and workers followed the rules. The joy is the idea. The idea, as an idea, worked. It was a beautiful, nourishing, vital, sumulating new concept which was a living, pulsating hub of creative energy and piles of fresh parsley. - Carol Goodden


“To Gordon, I think everything in life was an art event”



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